sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Do pós aos pós.





Antes de mais nada, gostaria de explicar que não fui infeliz. Ao menos acho que não o fui. O que me trouxe aqui foi algo mais. Foi o vazio, a negação total da razão. Acho que o mundo que me fez assim, mas muitos diriam: “Poxa, mas você teve tudo ao seu alcance”. Até chego a concordar com estes, mas também acredito que foi justamente o ter tudo, que foi demais. Informação, sexo, drogas, desprezo e até mesmo felicidade demais. E houve coisas de menos também: afeto, sabedoria e autenticidade – concluo que autenticidade, talvez seja a que mais faltou.

Essa confissão é talvez apenas um sussurro no escuro, porque o mundo virtual tomou conta de tudo. Tentei. Juro que tentei sorrir para meu próximo, lutar, resistir, fazer o mundo algo melhor, até não poluir e ser saudável eu tentei. Mas vejo que antes de tudo isso, eu sempre consumi. Consumi demais. Tanto produtos, quanto idéias. Me perdi nos símbolos que se representavam por si só, achando que talvez eles pudessem preencher este vazio.

Estranho, mas o que estou tentando demonstrar é que estou cheio deste vazio, pois nem sei se este texto me pertence, ou se irá pertencer a todos desta geração que não tem nome próprio. Pois a velocidade. A velocidade surda da cidade. Esta anda tão depressa que nem se quer escuta o tempo que se diz cansando e sem felicidade.

Felicidade, agora palavra de comando, deve sempre ser demonstrada, e em demasia. Vejo os livros de receitas sobre felicidade e o que leio são livros tristes que querem me ensinar a ser feliz. Sinto falta, faltinha, daquela pequena melancolia, de saudade de quando era triste. Sinto falta do choro escondido, do medo, da covardia, por que agora não se pode mais ter pequenos defeitos. Como no poema de Caiero, estou farto de Semi-Deuses.

Vivemos a promessa do que não aconteceu. Consuma para ser feliz e mendigue honestidade. Todo mundo agora está tão próximo, e será que apenas eu me sinto só?

Por isso escrevo para você que vem à frente, para que não se engane quando ler que nós fomos o ápice da evolução, porque aqui rejeito toda a razão.

Digo adeus ao mundo com coração e sem nenhum tostão no bolso. Porque para onde posso ir talvez eu não precise consumir para ser alguém.

Para o fim, um clichê, pois na era que vivemos é difícil se criar. Tudo é apenas uma colagem do já existe.

Adeus mundo cruel.

O homem pós-moderno.


texto escrito para um trabalho de filosofia sobre pós modernismo

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Beethoven e o gás


A luz do rádio relógio marcava luminosamente o horário, 11h00m, mas a música que invadia meu quarto não vinha do aparelho, e sim da rua, para ser mais exato, do caminhão de gás, que com sua música, não apenas entrava na minha casa, mas em meu sono e, por vezes até, em meus sonhos eróticos.

Lembro de uma vez que perdi uma prova porque o caminhão passou mais tarde, tamanha era a sua importância e a importância sua música que ambos me deixaram de recuperação naquele verão.

Por vezes fazemos nossas listas de musicas, filmes, livros que nos marcaram, mas lembro que sempre colocamos as que nos trazem lembranças felizes, e algumas vezes até as que nos deixam tristes, mas Beethoven e a “Pour Elise” resolveram fazer parte da minha história por outro sentimento: o desconforto.

Hoje, menos traumatizado, consigo analisar a importância deste desconforto, e até arrisco a dizer que meu apreço por musica clássica advenha dessa musica. Recordo do misto de alivío e tristeza no dia que a companhia de gás resolveu trocar a musica por um jingle que me escapa fácil. Enfim, acho que sinto falta de quando Beethoven invadia minha manhã dizendo que tinha gás.