sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Deus é underground



Procurando atingir um público marginalizado por igrejas tradicionais, a congregação abre espaço para as tribos urbanas


Por Max Santiago & Priscilla Santos

  Em uma rua residencial do bairro do Ipiranga, travessa da rua Vergueiro, um grupo de jovens roqueiros conversam animadamente em uma roda ao lado de uma lanchonete de paredes pretas e desenhos tribais pintados nelas. Quadros com imagens de demônios adornam as paredes do local, cds e camisetas de bandas de rock também podem ser encontrados.
 Os jovens usam cabelos longos, piercings e tatuagens, visual típico de headbangers da galeria do rock. A julgar pelo visual, qualquer um apostaria que a conversa dos jovens seria algo como drogas, bebidas e sexo. Porém para aqueles metaleiros o assunto é outro, eles falam sobre a bíblia, cristianismo e igreja.  Na placa pendurada na frente do salão está escrito Crash Church Underground Ministry , o que dá indícios do porquê das conversas ligadas a temas religiosos, o local é uma igreja.


Jesus, vida & Rock'n'roll 

 Dois televisores LCD’s aquecem o público antes do show, neles passam clipes de bandas de heavy metal; o som é pesado, mas as legendas mostram que as mensagens não têm relação com demônios, castelos ou dragões, discursos comuns nas músicas desse estilo. O evento da noite é o Heavy Metal Night, duas bandas irão se apresentar, Beni e To The Lamb, esta irá lançar no evento seu primeiro CD.
 As luzes se apagam. Os acordes distorcidos logo no começo do show deixam claro que o som está bem longe das canções das igrejas convencionais. Quando se encerra a primeira música escutam-se gritos dos fiéis de “Glória a Deus” e “Vamos quebrar o diabo”. Durante os intervalos das canções, o nome de Jesus Cristo é sempre entoado pelos componentes da banda, que tem um visual e som próximo de bandas de hard rock norte-americanas.
 A apresentação chega ao final, o clima é descontraído e os jovens permanecem no local e ajudam na organização do salão para o culto do dia seguinte, entre eles esta Cibele Caetano Silva, que migrou da Igreja Batista para a Crash Church há um ano. Declara que abandou a antiga congregação por se sentir excluída. Sempre gostou de um estilo musical e visual não muito aceito por igrejas tradicionais. “Quando a gente chega aqui, você se sente bem, ninguém te olha torto, você pode ser punk, skinhead, isto não importa, todo mundo aqui é irmão”, atesta Cibele sobre a igreja underground. “Aqui é a igreja do impacto”, afirma a fiel, mostrando – se feliz com a mudança.

Uma igreja de impacto

Por Max Santiago & Priscilla Santos


A ideia é causar impacto na vida de punks, metaleiros, góticos, skatistas e outras tribos urbanas. A “casa de Deus” sempre foi uma instituição formal e tradicional, até mesmo as congregações evangélicas renovadas, que deixam as mulheres usarem adornos, maquiagem e calça, ainda mantém certo pudor com relação a roupas e estilos diferentes do comum.  No final de 1998, Antonio Carlos Batista, dentro de sua garagem, localizada em Osasco, São Paulo, montou um grupo de louvor com o intuito de alcançar pessoas marginalizadas pela sociedade. Levando a seguinte mensagem “Jesus te ama e não se importa com seu visual”. Da Garagem, a igreja cresceu, teve diversos endereços e hoje se encontra no bairro do Ipiranga, zona sul de São Paulo. Vestindo preto, braço e cabeça tatuados, Edison Caetano, é diácono da Crash Church, explica sua relação com as tatuagens, “fiz depois que entrei na igreja, Deus não se importa se tenho tatuagem ou com minhas vestes, ele se preocupa com minhas vestes espirituais”. Isto mostra na prática que a igreja realmente está aberta a qualquer grupo underground, não importando qual grupo você faça parte. “Eu sou cristão antes de tudo, o cara curte som punk, careca e heavy metal, mas antes de tudo a gente é cristão”, é o que afirma Ivan Alves de Lima, responsável por organizar os eventos da Crash Church.


Há algo de diferente



 A Crash Church é como qualquer igreja tradicional, tem cultos aos domingos e durante a semana, celebra a santa ceia, faz batismos por imersão, estudos bíblicos e atividades de caridades em albergues. A mudança começa no visual do pastor, sai o terno e a gravata e no lugar entram as tatuagens, os piercings e os cabelos compridos.  “Muita gente vem perguntar se a gente faz sexo antes do casamento. Não. Vocês são a favor do aborto? Não. A gente não bebe, não fuma, não usa drogas. É uma igreja evangélica mesmo, só que pintada de preto” esclarece Ivan sobre os preceitos da igreja. Ivan defende a posição da igreja “Jesus quando veio a terra só andou com gente underground mesmo, prostituta, cobrador de imposto, mendigo, leproso... A gente tenta alcançar justamente os undergrounds ou marginais da sociedade de hoje”.  Tentando vencer os preconceitos e mostrar que Jesus ama os que se vestem de preto e tem moicano, através de acordes pesados, a Crash Church segue tentando mostrar uma opção diferente em meio ao vasto cardápio de denominações evangélicas.